RD 350
O veneno da viúva-negra Durante duas décadas a Yamaha RD 350 foi sinônimo |
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A japonesa Yamaha fabrica motocicletas desde 1954. Seu primeiro modelo -- a YA 1 -- era, curiosamente, cópia de uma moto européia, a alemã DKW RT 125. Com um monocilindro a dois tempos, fez sucesso e em três anos ganhava uma irmã de 250 cm3, dois cilindros e 14 cv: a YD 1, baseada na Adler MB 250. Dez anos depois a marca chegava ao mercado europeu e atingia os 305 cm3 com a YM 1. Nascia ali o embrião da RD 350. |
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O primeiro modelo RD 350, lançado em 1973, já trazia o temperamento agressivo que faria sua fama por duas décadas. O motor de dois cilindros a dois tempos desenvolvia 39 cv a 7.500 rpm |
A RD era uma esportiva radical, inspirada na TD1 250 de competição, que chegara ao Brasil em 1969 para rivalizar com as italianas Ducati nas provas de velocidade em Interlagos, o autódromo de São Paulo, SP. O motor de dois cilindros a dois tempos trazia uma importante evolução: o sistema Torque Induction de admissão por válvula de palheta (reed valve), um tipo de válvula unidirecional usada no sistema de admissão entre o carburador e o duto de entrada no cilindro. |
De olho no conta-giros: em aceleração total, o motor era fraco em baixas rotações mas ganhava um surto de potência quando o ponteiro chegava a 5.000 rpm |
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Quadro e suspensões (a traseira ainda com dois amortecedores) eram derivados da YR 5, mas havia um freio dianteiro a disco e, na versão RD 350 B, lançada em 1975, câmbio de seis marchas. Leve e firme, ela sentia bastante as irregularidades do piso. Com apenas 143 kg de peso, atingia velocidade máxima de 166 km/h e acelerava de 0 a 100 km/h em cerca de 7 s, passando pelo quarto de milha (400 m) por volta de 14 s. |
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Ainda refrigerado a ar e sem a moderna tecnologia do YPVS, o motor das primeiras RD dava trabalho: era preciso manter a mistura ar-combustível correta, a lubrificação adequada e até alternar entre velas mais quentes ou mais frias conforme o tipo de uso |
A vantagem da Yamaha ficava ainda maior com o emprego de escapamentos dimensionados, que traziam maior potência, mas jogavam o torque máximo para um regime ainda mais alto. O ruído estridente do motor em aceleração total ainda deve estar na memória de muitos aficionados. Mas, além das limitações dos freios, suspensão e -- não raro -- de habilidade do piloto para tanto desempenho, a RD 350 impunha outros desafios.
Era comum que a vazão da bomba de óleo (Autolube) estivesse fora do padrão (muitos acreditavam que a fábrica fazia isso para evitar ao máximo que os motores quebrassem) e que a mistura de marcha-lenta estivesse rica demais. Se o usuário não fosse atento a estes ajustes e a conduzisse muito tempo em baixa rotação, as velas acabavam-se em 1.000 quilômetros e o motor produzia fumaça azulada excessiva, com a saída do escapamento sempre oleosa.
Enquanto a importação de veículos cessava no Brasil, em 1976, a Yamaha ampliava a cilindrada da RD 350 (ao lado) para 400, em busca de maior torque |
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Em 1976, já com as importações fechadas, a Yamaha aumentava sua cilindrada para 400 cm3, ampliando o curso dos pistões para 62 mm, e adotava freio traseiro a disco e rodas de alumínio. A potência subia pouco, para 40 cv a 7.000 rpm, mas o torque máximo passava a 4,2 m.kgf a 6.500 rpm, indicando uma "domesticação" do agressivo motor. Dois anos depois era adotada ignição eletrônica. |
A RD 350 dos anos 80: refrigeração líquida, freios a disco, novos quadro e A distribuição de torque, porém, permanecia crítica: nada em baixas rotações e um "tiro" quando o ponteiro do conta-giros chegava a 6.000 rpm. Novos cilindros e carburação revista, já no ano seguinte, buscavam amenizar esse temperamento, mas uma solução mais eficaz era introduzida apenas em 1983: o YPVS, Yamaha Power Valve System ou sistema de válvula de potência Yamaha. |
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RD 500: a irmã de motor V4 |
Assim como a RD 350 era uma versão de rua da TZ 350 das pistas, a Yamaha ofereceu ao público uma esportiva de maior cilindrada derivada diretamente da YZR 500 de competição da equipe Kenny Roberts: a RD 500 LC, lançada no Salão de Paris de 1983. Embora tivesse quadro em aço (o de alumínio equipou apenas uma série denominada RZV 500 R) e outras simplificações em relação à moto de corrida, para conter os custos, seu desempenho era irrepreensível. O motor de quatro cilindros em "V", a dois tempos, possuía duas árvores contra-rotativas para anular vibrações e girava a mais de 10.000 rpm na potência máxima. Este valor não era divulgado, mas a velocidade máxima de 228 km/h e a aceleração de 0 a 400 metros em 12 s não deixavam dúvidas de seu potencial. |
Com o YPVS, a RD 350 LC chegava a 59 cv de potência a 9.000 rpm e a 4,8 m.kgf de torque a 8.500 rpm, este um ganho de 17% sobre o modelo anterior. A suspensão traseira evoluía para uma nova Monocross (não mais o sistema similar ao da DT 180 nacional), o freio traseiro voltava a ser a disco e os pneus eram mais largos, 90/90-18 na frente e 110/80-18 atrás, com rodas de três raios duplos.
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Em 1985 a RD assumia formas mais retilíneas, com a carenagem presa ao quadro e não ao garfo. No ano seguinte voltava a nosso mercado, agora produzida em Manaus, AM |
No ano seguinte, no Salão das Duas Rodas, a RD 350 LC era apresentada no Brasil e crescia a expectativa por uma Yamaha de maior cilindrada -- sua topo-de-linha era então a DT 180. Para o mercado, representava enfim uma opção à Honda CB 450, única moto média que o brasileiro podia comprar desde o fechamento das importações em 1976. |
O motor com válvula YPVS desenvolvia 55 cv e a levava perto dos 200 km/h, com o comportamento arisco -- e para muitos irresistível -- herdado de sua antecessora |
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Nesse ano concretizava-se, enfim, a fabricação da RD 350 LC no Brasil. Da nova unidade da Yamaha em Manaus, AM, começava a sair a moto mais esportiva já produzida no Brasil. Visual e mecanicamente era igual à japonesa, exceto pela taxa de compressão mais baixa (5:1) e por uma redução de potência, ambas por causa da gasolina nacional de menor octanagem: 55 cv a 9.000 rpm, com torque máximo de 4,74 m.kgf a 8.500 rpm. Outra perda era a torneira de combustível comum substituindo a automática, que só liberava o fluxo com o motor ligado. |
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O modelo 1988 ganhava carenagem integral, discos de freio perfurados, novo garfo Showa e a tarefa de suprir o mercado europeu -- razão da palavra Export exibida com orgulho nas laterais |
Do Brasil para o mundo Uma decisão da matriz fez com que em 1987 a produção da LC fosse concentrada no Brasil, sendo descontinuada no Japão. Com isso a moto recebia carenagem integral, como em uma das versões estrangeiras, novo garfo importado Showa e discos de freio perfurados, sendo rebatizada RD 350 R. A palavra Export, ou exportação, aparecia com orgulho na carenagem para informar que Manaus tornava-se a origem das RD vendidas em países europeus, como Itália e Espanha.
Apenas os tradicionais cores-e-grafismos foram modificados até que, na linha 1991, a Yamaha apresentou uma reestilização. A RD adotava carenagem integrada às tampas laterais, de modo a ocultar o quadro, e dois faróis redondos, em vez do único retangular, lembrando grandes esportivas da marca como a FZR 1000. Os retrovisores já não pareciam as orelhas do personagem de Walt Disney, o afogador estava em melhor posição e a aparência geral se revitalizava, após seis anos no mercado internacional.
Os dois faróis redondos marcaram a linha 1991. Novos pneus MT 75 melhoravam A Honda já oferecia à época a bela -- embora menos potente -- CBR 450 SR, criando uma concorrência que evidenciava o envelhecimento da RD. A maior desvantagem da Yamaha, porém, estava no conjunto quadro-suspensões: em muitos mercados havia sido substituída pela TZR 250, dotada de quadro de dupla viga, tipo Deltabox, como nas motos de competição de velocidade e quase todas as esportivas de rua do mundo. Não por acaso, era o quadro adotado pela CBR. |
Os retrovisores não mais lembravam as "orelhas do Mickey" e o afogador ganhava Mas não foi só por isso que a "viúva-negra" deixou o mercado. Em 1993 as novas regras de produção na Zona Franca de Manaus passavam a considerar nacionais -- impondo alíquota de importação de apenas 4,8%, em vez de 40% -- motocicletas montadas com componentes estrangeiros (sistema CKD, completely knocked down, completamente desmontadas). O programa poderia ser mantido por 18 meses até a progressiva nacionalização dos produtos. |
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A RD 350 R de 1992, sua última versão: a Yamaha a trocou por modelos importados, montados em Manaus pelo sistema de incentivos implantado em 1993 |
MOTOR - 2 cilindros em linha, 2 tempos, refrigerado a água; válvula eletrônica YPVS. Diâmetro e curso: 64 x 54 mm. Cilindrada: 347 cm³. Taxa de compressão: 5:1. Potência máxima: 55 cv a 9.000 rpm. Torque máximo: 4,74 m.kgf a 8.500 rpm. Dois carburadores Mikuni VM 26 mm. Partida a pedal. |
CÂMBIO - 6 marchas; transmissão por corrente. |
FREIOS - dianteiro, duplo disco de 267 mm Ø; traseiro, um disco de 267 mm Ø. |
QUADRO - tubular, berço duplo, em aço. |
SUSPENSÃO - dianteira, telescópica hidropneumática; traseira, monoamortecida. |
PNEUS - dianteiro, 90/90-18; traseiro, 110/80-18. |
DIMENSÕES - comprimento, 2,12 m; largura, 690 mm; entreeixos, 1,385 m; altura do banco, 780 mm; capacidade do tanque, 18 l; peso líquido, 167 kg. |
DESEMPENHO - velocidade máxima, cerca de 200 km/h; aceleração de 0 a 100 km/h, cerca de 6 s. |